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Edição Jornalística – PUC Minas

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Trajetória celeste: o que aconteceu com o Cruzeiro?

Entenda a crise que afeta o time mineiro desde 2019 e como o clube pretende sair dela; clube-empresa é a esperança para renascer a equipe de outrora páginas heroicas imortais

Por Isabella Cunha, Luiz Fabel, Maria Clara Lacerda e Henrique Toscano

A raiz do problema

A adversidade celeste começou em 2019, quando o então time comandado por Mano Menezes passou a ser investigado pela Polícia Civil do Estado de Minas Gerais (PCMG). O inquérito denunciou diversos atos irregulares praticados pela então diretoria, como lavagem de dinheiro, uso de empresas de fachada e venda de direitos de menores – considerado crime pelo Estatuto da Criança do Adolescente (ECA).

Na ocasião, a Rede Globo teve acesso a documentos internos e fez uma matéria completa sobre os problemas que envolviam a gestão do clube. Meses antes, o Cruzeiro celebrava o 6º título da Copa do Brasil e, posteriormente, a 38ª conquista estadual. A partir desse marco, no fim do primeiro semestre de 2019, instaurou-se uma crise interna.

Nos meses seguintes, a situação caótica da organização acabou refletindo no futebol da equipe. Dirigentes foram afastados, conselheiros denunciados e jogadores dispensados. O déficit monetário se expandiu, chegando à casa dos R$ 500 milhões e a crise, somada aos atrasos de salários e ao crescimento das dívidas, resultou no rebaixamento inédito do clube. 

No meio do furacão

Como se a situação do time não fosse caótica por si só, inúmeros atletas e ex-funcionários acionaram o clube na justiça por atrasos salariais, direitos de imagens, encargos trabalhistas e outras questões. Além disso, já na Série B, uma dívida envolvendo a compra do volante Denílson, feita em 2016, acarretou em punição da Fifa, que fez com que o time perdesse 6 pontos na disputa de 2020. 

No mesmo ano, com consequências da pandemia, como o fechamento dos estádios e o adiamento dos campeonatos, o time perdeu receita de cotas de televisão e outros recursos de patrocinadores. Em junho, o advogado Sérgio Santos Rodrigues assumiu o comando da equipe, com a promessa de reerguer-lo.

Apesar disso, no primeiro ano sob comando de Sérgio, sem o apoio da torcida no estádio e sem os recursos oriundos da venda de ingressos, o time não conseguiu o sonhado retorno à Série A, chegando a amargar a possibilidade de queda para a 3ª divisão. 

Tente outra vez

Em 2021, ainda sem o apoio presencial dos cruzeirenses no ano de celebração de seu centenário, o time encontrou mais um martírio: a impossibilidade de registrar novos atletas. A punição ocorreu por uma dívida de 2015 com o time uruguaio Defensor, pela aquisição do jogador Arrascaeta. 

Dessa maneira, o time ficou impossibilitado de renovar seu elenco, só podendo contar com peças que já o compunham, além de jogadores emprestados e adquiridos ainda no início do ano.

Na tentativa de conter os gastos, o clube celeste sediou confrontos em estádios de menor custo, como a Arena do Jacaré, em Sete Lagoas, e a Arena Independência, estádio do América, em Belo Horizonte. Além disso, o time promoveu campanhas de arrecadação de capital, como o Crupix. 

Um elemento importante para o momento do Cruzeiro foram os patrocinadores. Nomes como Pedro Lourenço, do Supermercados BH, e Régis Campos, da construtora Emccamp, auxiliaram financeiramente o clube para que o pagamento de salários atrasados pudesse ser feito, evitando mais punições no momento de risco. 

Clube-empresa

Agora, a Raposa tenta se estabilizar de uma maneira diferente, mas que já conta com apoio dos patrocinadores e torcedores: o clube-empresa. O clube-empresa tem como objetivo auxiliar clubes de futebol que estejam passando por dificuldades financeiras. Dessa maneira, a instituição endividada abre um novo CNPJ, sem dívidas, para arrecadar fundos destinados à quitação de pendências financeiras do CNPJ antigo. 

No podcast Jogo Econômico explicamos sobre a nova estrutura societária. 

Em entrevista à Globo, o presidente do Cruzeiro, Sérgio Santos Rodrigues, demonstra confiança quanto à transformação do Cruzeiro em clube-empresa. “Nosso grande objetivo é, em dezembro, assim que acabar o Campeonato (Série B), já migrar para a SAF (Sociedade Anônima do Futebol)”, afirma o presidente. “É um novo CNPJ, é esse novo CNPJ que vai disputar o Campeonato Mineiro”, conclui. 

O mandatário celeste também resumiu como deve funcionar o Cruzeiro SAF: “Futebol todo com a SAF, separado do clube social. É o que está previsto em lei. E aí, parte da receita que vem para a SAF tem que ser destinada para isso (dívidas) e, no caso particular do Cruzeiro, a associação continua sócia da SAF, então também vai receber dividendo disso”.

Apesar da esperança de dias melhores para o Cruzeiro e outros clubes, o modelo de clube-empresa pode ter aspectos positivos e negativos. Bruno Coaracy, advogado especialista em direito desportivo, explica em entrevista concedida ao UOL: “Como ponto favorável, de um modo geral vejo que o modelo societário proporcionará maior possibilidade de investimentos internos e externos”.

Por outro lado, de acordo com Coaracy, pelo modelo associativo da maioria dos times brasileiros, eles não podem nem são vistos como possibilidade de investimento visando obtenção de lucros. “O modelo associativo na qual a maioria dos clubes de futebol está constituída atualmente no Brasil não permite divisão de lucros, sendo inclusive seu resultado positivo não entendido como tal e sim como superávit, que, por expressa disposição legal, deve ser reinvestido na própria atividade do clube”, desenvolve ao mostrar que o modelo atual é o oposto da SAF.

O especialista também ressalta o aspecto negativo: “Vejo a incidência tributária a partir do 6° ano em relação às receitas oriundas das transferências de atletas, digo, pois para alguns clubes essa é a principal fonte de receita. Penso ser este um ponto sensível que certamente será muito debatido em momento futuro e oportuno, embora o texto traga uma diminuição da alíquota de 5% para 4% quando da incidência da respectiva receita”.

Fontes de dentro do Cruzeiro foram procuradas para conversar sobre a implantação do clube-empresa, mas não ofereceram mais informações.

Só o tempo dirá

A transformação do Cruzeiro em clube-empresa acontecerá agora no fim de 2021, o que permitirá uma maior flexibilidade no pagamento de dívidas da equipe. Com isso, os débitos da entidade poderão ser parcelados em até 5 anos e as taxas e juros aplicados podem reduzir até 40%, podendo até ser zerados. 

O projeto da equipe para o ano de 2022 já tem foco no ano seguinte, quando o time celeste pretende estar de volta à Série A. A ideia é que, com o clube-empresa, o Cruzeiro possa ter mais tranquilidade para focar no que realmente importa: futebol de qualidade.

Até o momento, na reta final da Série B do Brasileirão, a situação não é tão promissora. A Raposa não conseguiu adentrar na zona de classificação e luta para garantir a permanência nessa divisão do campeonato, onde está pelo terceiro ano seguido.

Imagem destaque: Reprodução / Twitter / Cruzeiro

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