COP 26 traz avanços sustentáveis, mas não atende às expectativas
Conferência das Nações Unidas não cumpre com metas que eram previstas por especialistas e frustra ativistas
Por Flávia Assis e Laura Couto
A COP 26 deste ano, aconteceu entre os dias 31 de outubro e 12 de novembro em Glasgow, na Escócia, em um momento crucial em que o aquecimento global já atinge todas as regiões do planeta. A Conferência das Partes é o órgão supremo das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e, desde que foi ratificada em 1994, acontece anualmente com a presença de mais de 190 representantes de países signatários. O objetivo é avaliar a situação das mudanças climáticas no planeta e propor novas metas e ações sustentáveis.
A conferência passou por pontos altos e baixos. Dentre as decisões, está o comprometimento para conter e reverter o desmatamento até 2030, que foi assinado por mais de 120 países, representantes de cerca de 90% das florestas do mundo. Outra promessa para 2030 foi a redução de metano, um poluente perigoso do ar e gás de efeito estufa, e do uso do minério, principal gerador de emissão de carbono. Para alcançar as metas que foram estabelecidas no Acordo de Paris, cerca de 500 empresas, responsáveis por serviços financeiros globais, decidiram arrecadar 130 trilhões de dólares. Esse valor representa cerca de 40% dos ativos financeiros mundiais.
Já o Brasil anunciou uma nova meta climática que prevê o corte das emissões de carbono de 43% para 50%, visto que, apenas em 2020, as emissões dos gases de efeito estufa aumentaram 9,5%. Essa alta foi impulsionada pelo desmatamento da Floresta Amazônica e pelo agronegócio, que representam juntos 72% do total dessas emissões. Além disso, outro objetivo é alcançar a neutralidade em 2050, de modo que as emissões que não puderem ser evitadas sejam combatidas com a tecnologia de captura e armazenamento de carbono, ou absorvidas por plantas e solos.
Quais foram as decisões?
Após três rascunhos divulgados nos últimos dias da COP 26, o texto final foi aprovado por quase 200 países-membros, mas o conteúdo está longe de ser uma unanimidade. Os debates giraram em torno de questões relacionadas a perdas e danos financeiros dos países, mercado de carbono e fundos de investimento.
Dentre as decisões estão:
- Redução “gradual” do uso de combustíveis fósseis sem restrições;
- Países ricos pagarão responsabilidades às nações em desenvolvimento pelos impactos da crise em seus territórios;
- O aquecimento global deve se limitar a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais para evitar que a crise climática se agrave;
- Os países desenvolvidos se comprometeram a cumprir, com transparência, a meta de financiar 100 bilhões de dólares anualmente até 2025 para países mais pobres, evitando o aumento da temperatura.
Uma das principais conquistas da COP 26 foi a regulamentação do funcionamento do comércio de créditos de carbono entre países. Agora, os países terão que descontar o crédito vendido quando prestarem contas de sua meta de redução de emissões. Países mais vulneráveis, que não se beneficiam dos mecanismos de mercado, tiveram que se conformar com a taxa de 5% sobre operações que tratam das negociações entre empresas, previsto no artigo 6° do Acordo de Paris. O compromisso é de ao menos dobrar a meta coletiva de financiamento, além de fornecer um recurso de 350 milhões de dólares destinados ao Fundo de Adaptação às Mudanças Climáticas para financiar projetos e negociações.
Se o país anfitrião, que gerou os créditos, não tiver como fazer o ajuste correspondente, não será possível abater o uso na Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do país comprador. Esses créditos poderão ter outra finalidade — serem vendidos nos mercados voluntários ou para os projetos sustentáveis de empresas, por exemplo. O país vendedor poderá, contudo, decidir quais outros créditos poderão ser abatidos da NDC do comprador e ajustados também nas metas do país que vende.
A COP 26 finalizou o livro de regras do Acordo de Paris e os pontos que estavam em aberto, como o artigo 6º, que se refere ao mercado de carbono, além dos trechos incluídos sobre os combustíveis fósseis.
Apesar das decisões consideráveis, a COP 26 foi decepcionante por deixar lacunas que esperava-se que fossem superadas este ano. Em 2015, foi prometido um fundo de 100 bilhões de dólares anuais a partir de 2020 para ajudar países mais vulneráveis. A expectativa era de que houvesse cobrança nesse aspecto — mas nada foi feito.
Esse apoio é necessário porque os relatórios apresentados à Conferência explicitam como as mudanças climáticas afetam os países de maneira desigual. Países africanos, por exemplo, gastam quase 10% do PIB com causas climáticas, embora emitam apenas 3% de gases de efeito estufa. O texto final que foi assinado prevê apenas uma análise dos pedidos de indenizações dos países mais desamparados.
A expectativa era de que 49 países, junto com a União Europeia, fizessem o compromisso de zerar a emissão líquida de gases de efeito estufa, que corresponde a mais da metade do PIB global. Entretanto, o problema persiste nos compromissos que foram adiados para 2030.
Além disso, uma questão polêmica é a controvérsia entre produção de riqueza e poluição. A restrição de processos produtivos poluidores acaba afetando as maiores nações em produção de riqueza, que são as que mais poluem. Por isso, um dos maiores obstáculos para um acordo eficaz esteve nas relações entre os principais participantes internacionais, especialmente a China e os Estados Unidos, que respondem por quase 40% das atuais emissões globais de CO2.
Outro ponto é a fragilidade das decisões tomadas. De acordo com o Greenpeace e a WWF (Fundo Mundial da Natureza), as ações, na prática, não serão capazes de limitar o aquecimento global até 1,5°C, que é um dos principais objetivos da Conferência.
As decisões vagas foram motivo de protesto na cidade-sede da COP 26 e em outros países da Europa. Em sua rede social, a ativista Greta Thunberg (foto) disse que, em resumo, a Conferência foi só “blá-blá-blá”, mas que o verdadeiro trabalho continua aqui fora. A jovem foi responsável por liderar um protesto na estação de metrô em Glasgow e por promover uma petição online, com quase dois milhões de assinaturas, demandando ações imediatas contra a crise climática.
Quer saber mais sobre como funcionam as trocas internacionais de carbono, o que é o Acordo de Paris e quais são os benefícios de uma política verde? Escute agora o nosso podcast “Mercado de Carbono”.
/