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Edição Jornalística – PUC Minas

Política

Expansão do BRICS: entenda a situação dos novos países do bloco

Seis novos países integrarão o bloco; compreenda o contexto da entrada de cada um

Filipe Soares, Gabriel Ramos, Guilherme Couto, Guilherme José, João Felipe Marques, Pedro de Lima e Thomaz Cruz

No dia 24 de agosto, em uma reunião na África do Sul, os líderes dos países que compõem o Brics anunciaram de forma conjunta a entrada de seis novos países no bloco econômico. Essa decisão, que já era discutida meses antes da oficialização, propõe a adesão das seguintes nações: Arábia Saudita, Argentina, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã.

Em sua conta no Twitter (X), o atual presidente do Brasil e um dos fundadores do bloco, Luiz Inácio Lula da Silva, comentou as expectativas e desejou boas-vindas aos novos integrantes:

Com a formação total dos 11 países, o Brics se torna responsável por cerca de 40% do PIB mundial, o que, segundo especialistas, pode gerar consequências positivas no que diz respeito à influência geopolítica do bloco e de seus integrantes. Em entrevista à CNN Brasil, Leonardo Paz, pesquisador do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da FGV (FGV NPII), entende que com a entrada dos novos países não haverá grandes mudanças na agenda defendida pelos Brics e destaca a relevância internacional do bloco com a nova formação.

“O posicionamento que estão colocando em relação às grandes soluções do mundo ganha muito mais força, pois estão mais próximos do G20. […] É um espaço para grandes debates relacionados ao comércio internacional, à liquidez entre os parceiros e novas articulações. Os integrantes poderão se encontrar com mais frequência, alinhar melhor as ideias e se apresentar enquanto um bloco”, comenta Leonardo Paz.

Esse pensamento é corroborado pelo atual ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, em texto publicado para a Folha de S. Paulo, em que fez uma análise da atuação do Brasil no processo de adesão de outras nações aos Brics, se atentando principalmente ao histórico do país nas políticas internacionais.

“O bloco é hoje, 15 anos após sua criação, muito mais relevante, e esse capital político ampliado continuará a crescer e a render dividendos políticos para todos os integrantes. O interesse de 23 países em unir-se ao espaço é exemplo eloquente do seu êxito, somado a conquistas tangíveis como a criação do NDB (Novo Banco de Desenvolvimento), o chamado “banco do Brics”. Ademais, não seria coerente que o Brasil, que advoga a reforma da governança global e a ampliação da participação dos países em desenvolvimento nos órgãos decisórios, como o Conselho de Segurança da ONU, bloqueasse o acesso ao grupo”, escreveu o ministro.

Todavia, há quem enxergue problemas na adesão de novos países ao bloco, como expõe o ex-diplomata Paulo Roberto de Almeida em entrevista ao G1, que entende que essa articulação não beneficia o Brasil.

“O grupo Brics ganha em descoordenação, pois é evidente que não existem convergências automáticas entre eles. A China sempre foi o país proeminente, no BRIC, no Brics e agora no Brics+. O Brasil se revela caudatário de uma grande potência, que quer constituir um grupo antiocidental. Ou seja, o Brasil não ganha nada com isso”, disse o ex-diplomata.

Entenda mais sobre a situação dos países que irão compor a expansão do bloco:

Argentina

Apesar da grande crise enfrentada nos últimos anos, o país sul-americano pode se juntar ao Brasil como integrante do Brics, podendo ser considerada, então, uma das economias emergentes mais importantes do mundo.

Mesmo sem nenhum benefício comercial direto, como área de livre comércio ou diminuição das tarifas, fazer parte do Brics tem um peso geopolítico importante. Em ano de eleição, o assunto tem sido alvo de discussões entre os candidatos, destacando-se Javier Milei e Patricia Bullrich, candidatos de direita que lideram as pesquisas e são contra a adesão ao bloco.

Defensor da iniciativa privada e livre mercado, Milei disse no Conselho das Américas que o país não irá se alinhar com “comunistas”, e ainda conclui: “Isso não quer dizer que o setor privado não possa negociar com quem quiser. O comércio deveria ser livre. E o privado deve comercializar com quem quiser. Eu não disse que devemos deixar de comercializar com o Brasil e com a China. O que estou dizendo é que é uma questão do setor privado na qual eu não tenho que me meter”.

Por meio das mídias digitais, Bullrich diz que a Argentina não irá de maneira alguma endossar o autoritarismo populista, indicando que irá retirar o país da aliança com o Irã, responsável por 85 assassinatos no atentado à Amia (Associação Mutual Israelita Argentina).

Já o presidente atual, Alberto Fernandez celebrou a adesão ao grupo. Para ele, entrar no Brics é a consolidação de um país fraterno e aberto ao mundo, além de uma oportunidade de fortalecer a Argentina e as relações com outros países.

Arábia Saudita

A entrada da Arábia Saudita tem forte significado econômico para os Brics. Trata-se da maior economia dentre os países árabes, com PIB anual superior a 1 trilhão de dólares. Donos de 17% das reservas de petróleo do planeta, e maiores exportadores de petróleo cru do mundo, os sauditas buscariam, junto aos novos aliados, algumas mudanças até mesmo na forma de negociá-lo.

Conforme o economista Jim O´Neill, veterano do Goldman Sachs (GS), as ligações próximas dos sauditas com os Estados Unidos poderiam transformar a adição da Arabia Saudita aos Brics “algo de grande peso”. O economista ainda apontou um possível movimento dos sauditas que poderia beneficiar todos os membros.

“O primeiro ponto é se eles começarão a precificar o petróleo em todas essas moedas locais, e não em dólares”, disse O´Neill.

A Arábia Saudita buscava, desde maio deste ano, a entrada no NDB, o banco dos Brics. Após uma análise feita pelo NDB, a adesão dos sauditas significa, também, uma possível opção de financiamento, uma vez que a Rússia atualmente encara diversas sanções econômicas, pela invasão na Ucrânia.

Do ponto de vista político, a proximidade dos sauditas com os Estados Unidos, entretanto, pode ser interpretada como uma possibilidade remota nesse momento. Apesar de Arábia Saudita e Estados Unidos estarem envolvidos em negociações aprofundadas e recorrentes sobre um abrangente acordo de segurança, nuclear e econômico, as relações entre Riyadh e Washington esfriaram nos últimos três anos, fruto de disputas a respeito dos direitos humanos, a guerra no Iêmen e o mercado do petróleo. Além disso, é importante ressaltar que, não apenas pela adesão ao Brics, a Arábia Saudita vê com bons olhos um estreitamento de relações com a China (que nos últimos meses vive um clima mais tenso com os norte-americanos). Isso, porém, não deve interferir na continuação do diálogo com os Estados Unidos.

Egito

O Egito, país com mais de 100 milhões de habitantes, está localizado no nordeste africano, sendo um elo de proximidade entre a África, Europa e o Oriente Médio, tendo para essa ligação o Canal de Suez, um local de passagem navegável que liga o mar Mediterrâneo e o mar Vermelho, para além de sua importância histórica e turística. 

Segundo apuração de Mauro Ramos – jornalista do Brasil de Fato – o país do continente africano passa por problemas econômicos que ainda reverberam atualmente, por mais que o governo egípcio de Abdul Fattah al-Sisi atribua a culpa à guerra na Ucrânia e à pandemia. Mas alguns apontamentos mostram que a crise passa por algumas escolhas erradas do governo, entre elas está a retirada de alguns subsídios aos combustíveis e a manutenção de alguns projetos em dólar, mas a moeda local – a libra egípcia – enfrenta uma forte desvalorização perante a moeda americana, em torno de 50%. Além da inflação no país que gira acima de 35%, o que vem causando impacto direto na população.

Para Mamdouh Habashi, membro do conselho executivo do Centro de Pesquisa do Árabe-Africano, em entrevista ao Brasil de Fato, alguns fantasmas fizeram com que potências do ocidente isolassem o Egito, colocando isso como uma falsa autonomia do país – em referência aos acontecimentos da revolta no Egito em 2011.

“O ocidente decidiu evitar isso, mas não pelos seguintes dois ou três anos, eles decidiram acabar com isso de uma vez por todas, e uma das formas era garantir que o Egito se tornasse tão dependente quanto um mendigo”, disse Mamdouh Habashi.

Ao entrar para o Brics, o Egito pode ter um caminho para sair da crise que se impõe no país, trazendo investimentos importantes para aquecer a economia e, com isso, auxiliar a pagar sua dívida externa – que atualmente apresenta-se com dificuldades para quitar, tendo que recorrer a empréstimos junto ao FMI (Fundo Monetário Internacional) para continuar honrando seus compromissos. Há, também, a possibilidade de amenizar os empréstimos junto ao banco dos Brics, por estar mais próximo do NDB, que atribui maior autonomia ao país, como diz a atual presidenta do banco, Dilma Rousseff: “sem impor condicionalidades ligadas a qualquer política pública ou projeto privado”.

Para alguns especialistas, a entrada do Egito pode auxiliar no longo prazo, mas em um primeiro momento pode ter pouco impacto, com um caráter de aproximação e relação com as principais economias.

Mapa comparativo indica que o Brics+ já supera, em PPP (PIB per capita), os membros do G7 – Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Japão, Itália e Reino Unido.

Etiópia

Segundo país mais populoso da África, com mais de 110 milhões de habitantes, a Etiópia ganhou destaque no cenário internacional ao se tornar um dos novos países a se juntar ao grupo dos Brics, antes formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Essa movimentação geopolítica tem o potencial de alterar significativamente o cenário econômico e político da região e do mundo.

A Etiópia é um país notável por sua localização estratégica, apesar de não ter saída para o mar. Durante anos, o país enfrentou desafios, incluindo um longo conflito com a vizinha Eritreia, o qual lhe rendeu um Nobel da Paz para seu primeiro-ministro Abiy Ahmed, por seus esforços de reconciliação.

No entanto, a Etiópia também é conhecida por seu crescimento econômico notável, impulsionado em grande parte por sua relação com a China. Sua economia tem crescido rapidamente no século XXI e é vista como uma futura potência africana, com um PIB de US$ 126.78 bilhões em 2022.

O ingresso da Etiópia no Brics pode abrir portas para oportunidades significativas. O Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), fundado pelo grupo Brics em 2014 como alternativa ao Banco Mundial e ao FMI, poderia fornecer capital para estimular o desenvolvimento infraestrutural no país.

Além disso, de acordo com o próprio Fundo Monetário Internacional (FMI), a Etiópia está a caminho de se tornar a terceira maior economia da África Subsaariana em 2023, ultrapassando Angola e Quênia. Isso demonstra o potencial econômico do país.

O primeiro-ministro Abiy Ahmed, em um evento de diálogo entre os Brics e a África, destacou a importância do multilateralismo reformado, enfatizando a inclusão, cooperação e diversidade de vozes e interesses. Sua visão é de um mundo equitativo e pacífico, amplificando as vozes de várias regiões do mundo.

Em resumo, a entrada da Etiópia no Brics promete redefinir a dinâmica geopolítica e econômica da África e do mundo. Com sua economia em crescimento, localização estratégica e compromisso com o multilateralismo, a Etiópia pode desempenhar um papel crucial no futuro do grupo Brics e nas relações globais.

Irã

Com sua chegada, o Irã traz um importante impacto no poder geopolítico, devido à sua localização estratégica no território asiático. Além de possuir território localizado nas três esferas do continente (Ocidental, Central e Sul), o Irã exerce controle sob uma importante região utilizada para a exportação de petróleo, o Estreito de Ormuz. O Estreito fica localizado no Golfo Pérsico, região que liga o país aos Emirados Árabes Unidos e é responsável por conter 65% das reservas petrolíferas mundiais.

Do ponto de vista econômico, o Irã se destaca pela exportação de recursos energéticos, como o próprio petróleo e o gás natural. Dentre seus principais parceiros comerciais estão a China, os Emirados Árabes Unidos e a Síria. Apesar das reservas naturais, o país está em grave crise financeira, decorrente de um período de décadas de má gestão e corrupção do governo. Além disso, uma série de sanções norte-americanas agravou a situação complicada no país, que enfrenta intensa revolta popular. Os líderes do governo enxergam no Brics a possibilidade de contornar o isolamento comercial criado pelas sanções econômicas ao país.

O Líder Supremo do Irã, Ali Khamenei, afirmou que a entrada do país no Brics foi um sucesso, em publicação no seu perfil oficial do Twitter (X):

Ele também elogiou a política do governo do presidente Ebrahim Raisi, por “estabelecer laços numerosos e diversos com diferentes países e continentes” e “resolver disputas com vizinhos”. O líder ainda disse que o ingresso ao Brics “reflete a situação do país”, já que “os países fundadores insistiram na entrada do Irã no bloco”.

O Irã é considerado por muitos um país “Pró-Oriente”, tal qual a China e a Rússia, pois possui um longo histórico de resistência à influência ocidental, principalmente pelos conflitos militares envolvendo os Estados Unidos. Esse posicionamento também está ligado a fatores culturais, já que a maior parte da população iraniana vem de origem persa. A relação econômica com a Síria é outro ponto que traz à tona o posicionamento político contra a interferência ocidental. O ingresso iraniano no Brics tem também um significado ideológico no cenário mundial, sobretudo no Oriente Médio.

Emirados Árabes Unidos

A entrada dos Emirados Árabes Unidos no Brics tem um impacto significativo tanto para o bloco econômico quanto para a geopolítica global. Os Emirados são uma das economias mais fortes do Oriente Médio, conhecidos por seu desenvolvimento econômico rápido, forte presença de cidadãos com alto poder aquisitivo e investimentos em tecnologia e infraestrutura. Sua entrada no Brics traz uma nova dimensão ao grupo, adicionando uma perspectiva do Oriente Médio, tal qual a possibilidade de cooperação em áreas como energia, comércio e tecnologia, criando oportunidades para parcerias econômicas mais sólidas entre os membros do bloco e os Emirados, beneficiando ambas as partes.

A entrada dos Emirados também remete a implicações financeiras substanciais para o bloco e para o país. Primeiramente, os Emirados são uma das economias mais fortes do Oriente Médio e são conhecidos por sua riqueza de recursos naturais, especialmente petróleo. Sua inclusão no bloco pode criar oportunidades significativas de investimento e comércio para todos os membros, especialmente se considerarmos a importância do petróleo e gás natural nos mercados globais.

No entanto, essa adesão pode trazer desafios ao bloco, já que eles têm laços estreitos com os Estados Unidos e outros aliados ocidentais. Isso poderia criar tensões dentro do grupo, que historicamente tem adotado uma abordagem mais crítica em relação ao Ocidente. A inclusão dos Emirados Árabes Unidos no Brics tem o potencial de impactar significativamente a dinâmica do bloco, oferecendo oportunidades de cooperação e desafios diplomáticos a serem enfrentados.

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