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Edição Jornalística – PUC Minas

Cultura

Bia Sampaio, DJ e artista visual, aposta em cultura independente

Artistas urbanos independentes não são aqueles que apenas pintam ou picham paredes. São pessoas que ocupam uma cidade. Esse também é o papel da arte. São pequenas demonstrações e contatos que fazem as pessoas refletirem sobre os espaços e a produção cultural inovadora que se dá, em grande parte, dentro de espaços não reconhecidos formalmente como artísticos.

Assim, a DJ e artista visual, Bia Sampaio, encontrou na cultura o melhor lugar para se expressar. Ela usa a habilidade com as pistas de som, tinta, lápis e as cores para articular esse campo de conhecimento a partir de Belo Horizonte, capital que adotou como campo de atuação e produção. Para isso, precisa de olhares e ouvidos atentos para compartilhar suas experiências e inspirações.

Conte um pouco da sua trajetória no meio artístico.

A minha trajetória começou há muito tempo, porque eu sempre gostei muito de desenhar e sempre soube que eu queria estudar artes, desde criança. Então eu sempre tive isso em mente. E foi em 2015 que eu entrei para o curso de Artes Visuais na UFMG e me identifiquei completamente. Ao longo da faculdade, fui desenvolvendo trabalhos em muitas áreas, mas principalmente em pinturas e já em 2017, conseguiu participar das minhas primeiras exposições: À Deriva 10 e 11. Também nesse ano, eu comecei a tocar como DJ, um outro lado artístico que eu experimentei por gostar muito de música. Em 2018 eu me mudei para a Austrália para estudar Artes Visuais, como um intercâmbio e aproveitei para trabalhar de DJ. Foi uma experiência incrível e um ano decisivo para o meu crescimento profissional. Agora de volta ao Brasil, pretendo terminar meu curso e seguir com a carreira de DJ.

Como você vê o cenário cultural independente em BH?

Eu vejo BH como uma cidade muito criativa. Eu vejo que é uma cidade que muita gente tem muitas ideias e quer empreender, o que é muito bom. Mas eu acho que esse polo cultural ainda está muito focado no Rio de Janeiro e em São Paulo. Então BH ainda está crescendo nesse sentido. Mas a gente pode ver que, desde que eu voltei por exemplo. Eu posso fazer uma comparação boa, como fiquei um ano fora, eu voltei e senti a diferença de um jeito muito forte. Acho que existem muitos espaços novos sendo criados, muita ideia nova surgindo, muita gente se unindo para trabalhar junto junto, sabe? E isso ficou muito claro no Carnaval, que é um grande evento cultural e o de BH foi sensacional. Eu acho que o cenário cultural daqui tem de tudo para crescer e se tornar tão grande quanto o do Rio e São Paulo, porque eu vejo aqui como uma cidade muito criativa.

“Acho que existem muitos espaços novos sendo criados, muita ideia nova surgindo, muita gente se unindo para trabalhar junto junto, sabe?”

Quais os desafios e possibilidades para você no trabalho independente?

Você trabalhar independente é uma coisa muito atrativa porque te dá muita liberdade. Eu acho que, principalmente quem está no meio artístico, precisa dessa liberdade e de trabalhar em um tempo que seja seu, e não do mercado. A gente sabe que cada pessoa tem um processo criativo diferente, então nem sempre a gente consegue se adaptar a esse tempo do mercado, nessa coisa de fábrica, sabe? E isso é muito bom no trabalho independente. E, para mim, o maior desafio que enfrento é o machismo. Quando você se lança no mundo fica muito suscetível a dar de cara com esse tipo de coisa. Tanto aqui em BH quanto na Austrália é muito difícil lidar com o machismo, com as pessoas achando que contratar uma mulher não é um gasto, e sim um investimento. Às vezes é difícil de fazer as pessoas entenderem isso, o que é bem ridículo mas ainda acontece muito. Principalmente no mundo de DJ, eu percebo muito machismo. A gente tem sorte de existirem alguns lugares que saem um pouco desse problema e que são mais prazerosos de trabalhar.

“Quem está no meio artístico, precisa dessa liberdade e de trabalhar em um tempo que seja seu, e não do mercado.”

De que forma surgiu essa vontade de apostar na produção de arte independente?

Na verdade não veio de uma vontade, era mais uma necessidade. Porque, ao longo do tempo que eu comecei o meu curso e até hoje, busquei vários trabalhos diferentes e uma coisa que sempre me incomodou em todos esses lugares era a falta de liberdade, era essa coisa de ter que dar satisfação para um chefe. Isso era algo que me prendia e me deixa um pouco paralisada. Foi a partir disso que eu admiti para mim que era de forma independente que queria trabalhar. É um percurso mais difícil, porque quando você está independente, você está sozinho, então é mais difícil. Mas, eu acredito que seja mais recompensador.

“É um percurso mais difícil, porque quando você está independente, você está sozinho, então é mais difícil. “

Como é a conquista do seu espaço, levando em consideração a abertura do mercado, que muitas vezes, prioriza artistas já desconhecidos?

Conquistar o espaço é um dos maiores desafios e tenho percebido que cada vez mais isso está relacionado às redes sociais. Por exemplo, quando uma balada vai contratar um DJ, eles querem contratar alguém que vai atrair um público, e eles baseiam isso nas redes sociais. Então, por exemplo, o Instagram é uma ferramenta de trabalho que faz toda diferença, porque quanto mais você consegue construir uma comunidade de pessoas que querem acompanhar seu trabalho, mais o mercado vai se abrir para você. Acho que a conquista do espaço no mercado independente, está muito atrelado ao seu sucesso ou não nas redes sociais. Isso é uma coisa totalmente nova, porque anos atrás não tinha nada disso, é uma coisa que as pessoas estão se tocando agora e que eu acho legal, fica mais fácil de ter acesso ao trabalho das pessoas. Mas, cria um novo desafio para a galera, porque muitas vezes o que vai definir a abertura do mercado para você não é, necessariamente.

Qual conselho você daria para alguém que também quer investir na produção de arte independente em BH?

O conselho que eu dou é o seguinte: produza incessavelmente. Produza muito, faça tudo e, o mais importante, não espere estar pronto para começar a fazer as coisas. Principalmente quando a gente é artista a gente fica nessa coisa de estar se preparando o tempo todo para fazer alguma coisa genial, sabe? Só que você se prepara tanto que você acaba não fazendo. A verdade é que você nunca vai estar inteiramente preparado, então você tem que fazer. Então às vezes eu tenho projetos artísticos que eu penso “nossa, eu não estou preparada”, mas tenho que fazer mesmo assim. E se ficar ruim, tudo bem, você faz de novo. E quando você tem mais maturidade, só de ter tentado, você vai estar mais preparado para isso. Então a gente fica nessa coisa do mito do artista genial, que chega lá de repente e faz uma Monalisa, sabe? Não é assim. A gente não pode esperar bater a inspiração para começar a fazer. Acho que esse é o melhor conselho que eu posso dar. Especialmente para mulheres artistas, acredita no seu trabalho. Não deixa ninguém te dizer que você não é boa o suficiente, muitas vezes dizem isso só porque você é mulher, sabe? Quando você é mulher você tem que se esforçar 10 vezes mais para ter o mesmo reconhecimento que um homem tem quando faz a mesma coisa. Mas, no fim das contas, você também vai ser 10 vezes melhor.  

“Quando você é mulher você tem que se esforçar 10 vezes mais para ter o mesmo reconhecimento que um homem tem quando faz a mesma coisa.”

Enquanto você morava fora do país, foi mais fácil ou mais díficil ter o reconhecimento do seu trabalho?

Quando eu morei fora, o meu trabalho se focou bastante no DJ. Eu não estava trabalhando, porém estava estudando artes visuais. Eu cheguei lá já querendo tocar e procurando oportunidade. Eu acredito que o reconhecimento foi mais fácil, pois existe a comunidade brasileira local que apoia os trabalhos de outros brasileiros. Além disso, quando eu fui para lá, eles estavam à procura de DJs brasileiros. Entretanto, durante o tempo que eu morei fora eu vivi muitas experiências por causa do machismo, com desvalorização do meu trabalho. São as pessoas especificas que salvam e dão apoio para continuar. Quando eu voltei para BH, eu senti, pois no exterior eu tinha o apoio de uma comunidade local que era menor, já aqui em Belo Horizonte os profissionais são fixos e por isso não há muita rotatividade e oportunidades de expandir.

Os trabalhos de Bia Sampaio estão disponíveis em seus perfis do Instagram: @bia.triz.sampaio e @bia___arte. Para ouvir suas playlists, acesse sua conta no Mixcloud: Bia Triz.

Grupo: Alexa Simon, Deborah Almeida, Elisa Senra, Érica Morato, Larissa Andrade e Mike Faria.

Todas as imagens usadas na reportagem são de autoria da entrevistada.

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